Eu sou do tempo em que a gente considerava ídolo qualquer fã que fosse assistir a um show dos Rolling Stones no exterior. Vê-los no Brasil era uma utopia, algo muito além da imaginação. Ter um show dos Stones em Porto Alegre, era ficção científica. Tão realista quanto o ET ou Guerra nas Estrelas. Por isso, o que ocorreu no dia 02 de março de 2016, no Estádio Beira-Rio, diante de 49,073 pessoas, até agora parece fantasia, delírio.

Quando começaram os rumores sobre uma nova tour sul-americana, desde sempre Porto Alegre apareceu entre as candidatas. Falava-se em Brasília, Belo Horizonte, Recife e Fortaleza, além de Rio de Janeiro e São Paulo. A verdade é que Porto Alegre desde muito cedo foi a terceira cidade escolhida, mas naturalmente a concorrência era muito grande e promotores locais espalhavam boatos de todo tipo, tentando de alguma forma vender os seus peixes e ter show dos Stones onde queriam.

Por mais que eu tivesse informação de que Porto Alegre, e o Beira-Rio, receberiam os Stones, sempre havia uma ponta de dúvida, de temor. Lembro que alguns adolescentes debocharam da nossa informação pelas redes sociais – eles falavam em Brasília, cidade que nunca foi de fato cogitada, exceto por notícias plantadas na imprensa.

Até que na manhã de 5 de novembro, uma fonte me chama pelo Facebook e confirma: “o contrato para o show de Porto Alegre acaba de ser assinado. Está tudo confirmado e a tour será anunciada”. Imediatamente postei a informação na fanpage de Stones Planet Brazil e acho que 30 minutos depois, os próprios Rolling Stones anunciaram a tour, com a capital gaúcha incluída.

Raras vezes fiquei tão feliz e eufórico. Muito menos pelo furo, muito mais por poder ir ver os Rolling Stones com o meu carro, dirigindo por avenidas pelas quais passo diariamente e depois voltar para casa e dormir na minha cama.  Para quem já tinha dado 3 voltas ao mundo para ver 16 concertos da banda, ver o 17º em casa era irreal.

Foram dias de muita expectativa, mas eles foram suportados porque felizmente havia vários shows para irmos antes. Quando o dia 01 de março chegou, havia uma etapa a ser cumprida antes. Éramos anfitriões, ao lado dos amigos da Hot Licks, da Fanfest oficial de pré-show em Porto Alegre. O evento reuniu mais de 150 pessoas de vários lugares do mundo no Groovaholic Pub. Havia argentinos, uruguaios, norte-americanos, ingleses, alemães, além de amigos de Minas Gerais, Santa Catarina, São Paulo e Rio de Janeiro. Foi uma festa digna da importância do evento da noite seguinte, que ocorreria no Beira-Rio, a exatos 7.6 quilômetros de distância do bar.

Depois de buscar meu ingresso e 9 passes VIP para a recepção de pré-show, fui para o estádio pelas 17h. Logo encontrei os amigos com quem iria ao evento e topei também com outros tantos camaradas. Encontramos de novo toda a turma do staff e backing band, como de costume. Bernard, Chuck, Tim, Darryl, Tyrone, Charlotte, etc. Entramos no estádio pelas 20h40min, uns 20 minutos antes de o show começar – já chovia forte.

Soubemos que o show começaria com Jumping Jack Flash uns 5 minutos antes do início, pois Pierre de Beauport testou a tele Fender de Keith em open G e deu a nota Si, que é a largada do clássico de 1968. Logo, não havia dúvidas, pois a guitarra teria de estar com capo na quarta casa (Si).

Era chuva demais e não havia como tocar bem, dançar, correr ou pular no palco. Estava tudo ensopado. Mas quanto mais a dificuldade aumentava, mais os Stones se enchiam de energia. “Ah, vocês estão molhados? Então, nós vamos para a chuva com vocês?”, admitiu ter pensado Mick em depoimento de pós-show. E foi isso que ocorreu. As feras saíram das suas jaulas e houve um show épico. Cheio de erros, mas repleto de vibração e emoção.

Ruby Tuesday foi tocada apenas em Porto Alegre. Muitos fãs choravam. Quando Gimme Shelter começou a ser tocada, o temporal aumentou ainda mais. Mick dançava e cantava debaixo de uma tormenta. Mesmo de salto alto, Sasha Allen rumou para o palco B amparada pela mão de Jagger e lá a dupla fez uma interpretação impressionante. O público respondeu em dobro e o nível de energia naquele momento no Beira-Rio lembrou Buenos Aires ou La Plata.

Porto Alegre esperou mais de 50 anos para receber os Stones. Quando isso ocorreu, tinha de cair o mundo em cima do estádio. Mas o que poderia ser um problema, virou combustível. Os Stones reconheceram o calor do público depois do show, que foi disparado o concerto mais vibrante que eles já deram no Brasil. Inacreditável!

Se eu nunca mais ver um show dos Stones (espero ver vários ainda), terei atingido vários dos meus sonhos. Vi não um show dos Stones, mas 17. Assisti à banda nos Estados Unidos, em Lisboa e em Londres, visitei Dartford, dei três voltas ao mundo, encontrei dezenas de amigos, estive com dois dos Rolling Stones (Charlie e Ronnie) e vi a banda no Beira-Rio, que fica a 6.5 quilômetros da minha casa. Obrigado, não posso reclamar da sorte!

Setlist

Jumping Jack Flash
It’s Only Rock’n Roll
Tumbling Dice
Out Of Control
Let’s Spend The Night Together
Ruby Tuesday
Paint It Black
Honky Tonk Women
You Got The Silver (Keith)
Before They Make Me Run (Keith)
Midnight Rambler
Miss You
Gimme Shelter
Start Me Up
Sympathy For The Devil
Brown Sugar
You Can’t Always Get What You Want
Satisfaction

 

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