Por Tatiana Cavalcanti*
Agora SP
No pequeno palco de um lugar chamado Marquee Club, em Londres, cinco rapazes magrelos entoaram algumas das canções de seus ídolos do blues no dia 12 de julho de 1962. Ali, com uma atitude rebelde e sem que os presentes soubessem, estavam dando início a uma revolução musical. O som que nasceu naquela apresentação se espalharia pelo mundo e mudaria o estilo de vida de diversas gerações. Naquela noite, nasceria uma das maiores bandas de rock de todos os tempos, os Rolling Stones.
Daquela primeira apresentação, restaram apenas Brian Jones, Mick Jagger e Keith Richards. Logo em seguida, o baixista Bill Wyman e o baterista Charlie Watts completariam o time. O grupo inglês passaria a ser conhecido por suas atitudes debochadas e irreverentes no palco e fora dele.
Logo, sua música envolvente atravessaria o oceano e chegaria à Pompeia, bairro que é considerado um dos berços do rock paulista. Enlouquecidos por sucessos que embalavam o mundo, como “(I Can‘t Get No) Satisfacton” e “Jumpin‘Jack Flash”, os músicos Celso e Oswaldo Vecchione se reuniram com dois amigos, os irmãos Arnaldo Baptista e Sérgio Dias, para tirar um som.
Nos idos de 1967, os amigos reproduziam os acordes de Keith Richards na guitarra e tentavam entender o que Mick Jagger cantava. Daquela garagem, surgiram duas bandas de grande relevância para o rock nacional, Os Mutantes, de Baptista e Dias, e o Made in Brazil, dos irmãos Vecchione.
O que eles nem imaginavam é que seu país acabaria se transformando em um destino querido pelos roqueiros ingleses. A dupla Jagger e Richards desembarcaria no Rio de Janeiro em dezembro de 1968 para férias que entrariam para a história da música. Nessa viagem mítica, surgiu o famoso título “Glimmer Twins” (Gêmeos Brilhantes, em português), pseudônimo criado para assinar a parceria Jagger/Richards em suas composições.
Nos primeiros dias de janeiro de 1969, a dupla partiu para a cidade de São Paulo.
A convite do banqueiro brasileiro Walther Moreira Salles (pai do cineasta Walter Salles), Jagger e Richards passaram dez dias em um sítio em Matão (a 305 km da capital). Foi ali, em meio à tranquilidade, que compuseram “Honky Tonk Women”, um dos maiores clássicos da banda.
“Eles fizeram essa viagem ao Brasil logo após a gravação do “Rock and Roll Circus”, que, hoje, é um dos registros em vídeo mais importantes da banda. Keith chegou a afirmar que a cidade de São Paulo parecia com Nova York e que as pessoas eram muito apressadas”, afirma o jornalista Nélio Rodrigues, autor dos livros “Sexo, Drogas e Rolling Stones” e “Os Rolling Stones no Brasil”.
Outra canção clássica que recebeu influências brasileiras foi “Symphaty for the Devil”. A música, que começava em ritmo bem lento, no processo de gravação, foi ganhando mais vibração e virou o que Jagger sempre considerou um samba.
Em meio a esses acontecimentos, o líder do Made in Brazil Oswaldo Vecchione se tornou pai pela primeira vez.
O filho mais velho recebeu o nome de Mick Jagger, Michael Phillip. Em seguida, veio uma garota, Priscilla Jones, uma homenagem à ex-mulher de Elvis, Priscilla Presley, e ao fundador dos Stones, Brian Jones.
Quando se reunia com a banda para ensaiar, Oswaldo, 64 anos, sempre levava os filhos. “Os Rolling Stones têm o poder de unir nossa família, tanto que meus irmãos e eu fomos contagiados por essa paixão. Hoje, meus filhos escutam Rolling Stones comigo e adoram. Foi a melhor herança que meu pai poderia me deixar”, afirma a gerente comercial Priscilla Jones Vecchine, 40 anos.
O músico Rick Ricardo Vecchione, 37 anos, deveria se chamar Keith Richards.
“Meu pai foi me registrar, mas disseram que era impossível porque Keith era nome de mulher.” Os dois filhos mais novos de Oswaldo são Eric Richard, uma junção de Eric Clapton e Keith Richards, e Charlie Wyman, uma homenagem a Charlie Watts e a Bill Wyman. “Se eu tiver mais um filho, será Mick Wood. Falta homenagear o Ronnie Wood”, afirma Oswaldo, citrando o guitarrista atual, que substituiu Mick Taylor em 1974.
Influenciada pelos músicos e amigos do Made in Brazil, Silvana Monfrinatti, no início da década de 1970, passou a admirar o rock sujo e despudorado dos Stones. A artista plástica, hoje com 51 anos, afirma que o grupo inglês mudou a sua vida.

“Eu era de uma família tradicional e conservadora. Graças aos Stones, tornei-me mais contestadora e independente. Eles mudaram meu estilo de vida.”
A mãe passou adiante a paixão. A filha Mari André, 22 anos, gosta da banda de tanto escutar sobre ela. Ao saber que sua mãe ficou arrasada por não poder ir a um show no Rio de Janeiro, em 2006, decidiu presenteá-la com uma tatuagem. “Fizemos a língua, que é o símbolo da banda, na nuca. Estávamos de mãos dadas. Foi um momento único”, afirma Silvana.
Sexo, drogas e rock‘n‘roll
O nome Rolling Stones surgiu de uma música de um dos ídolos dos roqueiros, o bluesman americano Muddy Waters. Ao ser convidado para realizar o show no Marquee, Brian Jones foi questionado sobre a forma como deveriam divulgar o show. Surpreso, o guitarrista pensou um pouco, olhou para o lado e viu um disco de Waters. Lá estava a canção “Rolin’ Stone”. Pronto, esse seria o nome, mesmo que os demais integrantes tenham detestado a escolha.
Há cinco décadas na estrada, os Rolling Stones mantêm sua essência no blues. Nesse longo caminho, a banda (ou bando, como alguns diziam na época) sobreviveu a mortes, a drogas, a prisões, a escândalos sexuais e a histeria coletiva.
O primeiro clássico, “(I Can‘t Get No) Satisfaction”, surgiu depois de uma pesada noite de sono. Keith Richards costumava dormir abraçado à sua guitarra e sempre deixava um gravador ao lado da cama. Um dia, ao acordar, percebeu que a fita virgem colocada na noite anterior estava no fim. Sem ter a menor ideia do que tinha feito, apertou o play e começou a ouvir seus roncos. Até que, de repente, percebeu que havia gravado um som interessante.

Mick Jagger colocou na melodia uma letra reclamando da vida e, assim, nasceu a canção que chegou a ser considerada o melhor rock do século 20.
O sucesso estrondoso trouxe, porém, problemas graves. Em 1967, Brian Jones, Mick Jagger e Keith Richards foram presos por posse de drogas. O vício em heroína era visível, e a união do grupo estava ameaçada.
No início de 1969, o guitarrista Brian Jones foi despedido da banda que fundou por causa da sua dependência de drogas. Os integrantes do grupo já preparavam o show de estreia do novo guitarrista, Mick Taylor, quando receberam uma notícia estarrecedora.
Brian Jones fora encontrado morto na piscina de sua casa, em circunstâncias até hoje desconhecidas. Ele tinha apenas 27 anos.
O vocalista e gaitista inglês Peter Screw, 61 anos, mora em São Paulo há dez anos e abriu com sua banda aquele concerto de Hyde Park, em 1969. “Foi incrível tocar para tantas pessoas e uma honra abrir o caminho para os Stones.”
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Loucuras de fãs
O guitarrista Fabio Brum, 40 anos, é fã de Keith Richards desde a adolescência e não poderia perder o primeiro show dos Rolling Stones no Brasil, em 1995. Em uma tentativa desesperada para conseguir ingressos, Brum pegou o carro do pai de sua namorada à época e dirigiu por 24 horas ao longo de diversas cidades até conseguir alcançar seu objetivo.
“Foi uma loucura porque não dormi até conseguir o que queria. Foi o único show que vi deles. Valeu a pena.”
Em 2006, a banda escolheu o Brasil para gravar o DVD de sua turnê mundial A Bigger Bang. O Rio foi testemunha do maior show de rock da história até hoje em número de espectadores: mais de 1,5 milhão de pessoas pisaram nas areias de Copacabana para ver os ingleses.
Após esse show, surgiu o único blog brasileiro dedicado à banda, “Stones Planet Brazil”. O espaço nasceu da persistência de André Ribeiro, 41 anos, em divulgar novidades sobre os Rolling Stones. Eles estão em cada momento da minha vida, são a trilha sonora que me acompanha há 30 anos.”
A paixão “stoneana”‘ também tem sotaque argentino. Em Buenos Aires, o “hermano” Juan Ignácio Muñoz, 37 anos, decidiu abrir um bar temático dos Rolling Stones. O 40×5 Tributo Bar fará dez anos no mesmo dia em que os Stones completarão meio século. No balcão do bar, uma estátua de Keith Richards recepciona os clientes que vão pedir uma cerveja.
Passados 50 anos desde aquele primeiro show no Marquee, os Rolling Stones se mantiveram na estrada porque sobreviveram a modismos, mantendo a receita da boa música e acumulando ouvintes de várias gerações. Em 2005, perguntaram a Mick se aquela seria a última turnê de banda, e ele observou: “A primeira vez que respondi isso foi em 1966. Foi filmado”.
Na próxima quinta-feira, os Rolling Stones lançam em Londres um livro de fotos recuperando imagens das cinco décadas de carreira da banda. Um documentário deve ser lançando em setembro, mostrando a trajetória do grupo. Espera-se que os Stones realizem uma turnê em 2013, quando Charlie Watts completará 50 anos de conjunto.
Recentemente, eles fizeram ensaios em New Jersey, nos Estados Unidos, e em Londres, na Inglaterra. Mas, como de costume, Jagger faz suspense e não confirma os shows comemorativos, deixando os fãs desesperados, loucos para ver seus ídolos sobre o palco mais uma vez.

*Tatiana é leitora de Stones Planet Brazil e grande fã da banda.