Dada a largada da No Filter Tour com os dois concertos de Chicago, a expectativa em torno das próximas apresentações dos Rolling Stones cresceram imensamente. Sempre que a banda sobe ao palco se espera um show sensacional, mas seria hipocrisia dizer que não havia preocupação depois da cirurgia cardíaca sofrida por Mick Jagger. Então, o que podemos esperar dos Rolling Stones daqui por diante com base no que ocorreu nas duas primeiras gigs?
Como eu já escrevi aqui em Stones Planet Brazil depois de assistir aos dois shows repletos no Soldier Field (mais de 60 mil pessoas em cada noite), Mick agiu como se nada tivesse ocorrido. Podem ter certeza, não existe preocupação com ele. O cara foi o mesmo de sempre, sem que se notasse qualquer diferença em sua performance. Mick correu e pulou para todos os lados, mantendo o público ligado no show.
Vá aos shows para conhecer os Stones
A partir desta constatação, tenho de fazer outra, que é fundamental. Só é possível conhecer os Rolling Stones em sua plenitude e entendê-los depois de assisti-los ao vivo. Ninguém que nunca tenha estado diante deles em cima de um palco pode compreendê-los e conhecê-los.
A explicação é óbvia. Ao vivo, no show, não tem edição, não tem imagens cortadas. Você vê o todo. Tem quatro caras em cima de um palco e se você estiver atento vai reparar nos olhares, nas expressões, vai escutar como eles soam de verdade e reparar em tudo que está em volta. E a soma destes fatores são os Rolling Stones.
Se for atento, vai notar que é possível saber qual será a primeira música do show pelo teste que é feito por Pierre de Beauport minutos antes dele começar. Pierre quase sempre indica ao menos o primeiro acorde. Fica fácil descobrir o que virá pela frente.
Vá aos shows e repare no detalhes. Até na Jane Rose tirando fotos do concerto. Observe tudo. Isso tudo somado fará você entender e conhecer os Stones. Mais tarde você entenderá porque as coisas são desta ou daquela maneira.
Use os shows em blu-rays, DVDs, YouTube, etc para acrescentar informações às que você colheu nos shows. Eles são válidos e excelentes. Complete seu conhecimento com as mídias disponíveis, mas nunca substitua a presença nos concertos.
Keith mais concentrado
Dito isso, agora posso falar a respeito do que esperar comparando os dois concertos iniciais. Keith Richards esteve muito concentrado em tocar em ambos. Praticamente não saiu do lugar. Na primeira noite, raramente Keith deixou o seu posto ao lado esquerdo da bateria de Charlie.
Coube a Mick, e também a Ronnie, a tarefa de entreter o público. Nem mesmo quando os três homens da linha de frente habitualmente vão para o palco B em Miss You, Keith saiu do lugar. Woody o chamou, fez sinais, mas Keith seguiu sério tocando. Estava meio carrancudo na primeira noite.
O segundo show teve um Keith mais sorridente. Ainda assim ele quase não saiu do lugar. Foi para o palco B em Miss You, mas retornou antes de Mick e Ronnie. O fato é que de todos Keith é quem precisa se preservar mais. E ele é esperto, macaco velho. Sabe o que pode ou não fazer. As corridas pelas passarelas são cada vez mais raras.
Os erros não são novidade. Keith começou a tocar Midnigth Rambler na terça-feira enquanto deveria tascar Paint It Black. É um equívoco e tanto. São músicas em tons diferentes e uma nada tem a ver com a outra. Mas Keith faz dessas coisas. Faz agora aos 74 anos e fazia aos 30. Claro que a idade contribui para que isso ocorra mais seguidamente.
Ao mesmo tempo, os timbres das guitarras de Keith estão cada vez mais crus, cortantes, secos. É sensacional ouvir o som que sai especialmente das Fender em Open G, mas também da Gibson com que toca Gimme Shelter. Diga-se de passagem que os timbres de Ronnie também estão matadores. Muito disso é trabalho dos roldies, especialmente de Pierre de Beauport, que trabalha com Keith desde o fim dos anos 1980.
Parceria bem afinada
O fato é que Ronnie não precisou tomar a dianteira musical dos shows, como fez em tantas oportunidades quando o amigo Keith estava em dificuldades. Da mesma maneira que Richards segurou as pontas nas épocas em que Ron estava no fundo da garrafa. Ou quando Keith cantou três canções porque Mick estava com problemas na voz.
Os Stones são assim. Um segura as pontas do outro. Pois nem sempre todos estão em bom momento. E essa é uma das razões da longevidade da banda. Por mais que tenham brigado e discutido, e até se sacaneado no palco, na hora em que é preciso eles funcionam como um time. E isso vale também para a banda de apoio.
Em algumas noites todos estão bem e os shows são de outro planeta. Em outras, nem tudo dá certo, mas ainda assim o conjunto faz a banda funcionar. E isso é mais claro do que nunca hoje em dia.
Se você tiver a sorte de pegar uma noite inspirada e com os astros a favor, o show será uma experiência indescritível. Caso tenha menos sorte e as coisas não saiam tão bem, na pior das hipóteses o concerto será superior ao da maioria dos artistas que você poderia assistir.
Nestes dois primeiro shows, Keith esteve concentrado em tocar e tocou bem, a ponto de Ronnie poder se colocar mais como coadjuvante musicalmente. Se o velho pirata precisou ficar mais quieto na dele, então o cigano veterano deu apoio a Mick com a performance.
E acredite. Desde os seguranças pessoais dos Stones que ficam acompanhando os movimentos de Mick, Keith e Ronnie, até o coreógrafo de Jagger, Chucky Lapow, todos fazem parte de uma engrenagem, incluindo esposas, filhos, netos. Juntos eles formam a base de apoio fundamental para os Rolling Stones. Sally assessora Ronnie, Charlotte dá apoio para Charlie e assim as coisas caminham.
Ainda vale assistir aos Stones?
Portanto, depois de ir a dois shows em Chicago, observar cada detalhe que pude, fico tranquilo em afirmar que os Rolling Stones estão com o trem nos trilhos. Nada está fora do lugar e a tendência é que com o seguimento da tour os concertos fiquem ainda melhores.
Os Stones parecem dispostos a incluir algumas novidades. O set acústico no palco B está de volta. Temas menos tocados como Play With Fire, Sweet Virginia, Sad Sad Sad e Monkey Man reapareceram. É bom sinal.
Vá em frente, assista aos shows e tenha uma experiência não apenas musical, mas também de vida. Os Rolling Stones vão muito além da música.
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